Saudade de almoçar fora uma
vez na semana. Não queria comprar seu apartamento, Matheus? Agora come ele!
Ainda bem que a empresa oferece almoço. Mas a quebra de rotina é sempre
refrescante. Também não posso reclamar. Daquela uma vez por semana, ainda consigo fazer uma
vez por mês. A última foi em outubro. Do Outubro Rosa, sabe? Pois é.
Shopping, depois de
almoçar... Sobremesa! Parada na Cacau Show para escolher uma (que se tornou
algumas) trufa. Bem escolho pensando só no sabor que espero sentir com aquela de “Recheio
de iogurte de morango”, pensando somente em mim, no meu almoço mensal dos
prazeres, quando a atendente em vez de me dizer o preço da guloseima me lasca
um “A trufa que você escolheu é em comemoração ao Outubro Rosa e o dinheiro vai
para o tratamento do câncer. Poderia deixar um recado para as pessoas com
câncer?”. E empurra um bloquinho de papel pink e uma caneta.
Mu-rro-na-mi-nha-ca-ra! Como,
moça? Do nada, assim? E meu almoço dos prazeres? Câncer? Na minha sobremesa?
Olho para a turma que me acompanhou na saidinha para espairecer e solto um “Vai pedir isso bem
para mim, gente?”.
Enquanto a atendente
solidária com a causa do Outubro Rosa embala o meu pedido, eu encaro o
bloquinho com a caneta na mão. Pressionado pelo, “Vai, Má, você é bom para
escrever essas coisas...” das minhas amigas, começo a pensar no que escrever, o
que dizer para uma pessoa em tratamento contra o câncer, como não soar cafona,
clichê ou insensível com a situação? Pensei em dizer que tudo ficaria bem para
aquele que lesse o meu recado, mas e se não ficasse? Deixar de dar o recado? Sem
chance. Eu queria aquela trufa e com ela veio o chacoalhão de que a vida não é
só feita de chocolate.
“A paz é um estado de
espírito que podemos ter não importa o quê.”. Ponto. Esse foi o meu recado. Foi
o que veio. E é o que tenho pedido para mim. Foi o que desejei a quem lesse.
Não assinei o bilhete de tão desnorteado por ter sido pego de surpresa, mas, da mesma forma que a paz, para o que eu desejava não era preciso ter nome,
cara ou motivo e, sim, paz. Eu agradeço pela minha saúde, mas peço por paz. Com
dinheiro ou não, é preciso ter paz. Família ou não, comida ou não, frio ou não,
amor ou não. Peça paz.
Hoje não trabalhei. Fui para
a empresa, mas não consegui ficar e certamente não aguentaria até o fim do dia
por conta de uma gripe que começou a dar sinais um dia antes. Foi outro
chacoalhão. De tempos em tempos precisamos da atendente em prol do Outubro
Rosa, da gripe, de possíveis outras doenças, da morte, de duas barragens desmoronando
e inundando cidades para nos lembrar o quão besta é o nosso dia a dia nessa
vida.
Será que valeria um
aplicativo para nos cutucar sobre isso? Lembro do app que uma amiga minha já teve: o do programa “Medida
Certa”. Aquele do quadro do Fantástico, sabe? Claro que sabe. A cada x minutos vinham as vozes do
Zeca Camargo e da Renata Ceribelli com recados como “Que tal um fruta?” e “Psiu,
psiu... Não vai comer nada não?” – esse segundo me irritava profundamente.
Imagine, de hora em hora, ou ao menos uma vez ao dia, ser lembrado que você poderá ter câncer,
que amanhã poderá precisar de uma bolsa de sangue, de um órgão, que você pode
estar bem mas muitos outros por aí não estão e ignorar isso é a pior das
cegueiras? Valeria o lembrete?
Sou uma pessoa que vivo para
mim. O último a ser voluntário em ações organizadas pela empresa. Passo longe
de grupos que visitam hospitais e asilos nos finais de semana. Sou um tanto descrente
por ver tanta gente ser solidária para dizer que é, para aumentar os álbuns de
fotos do Instagram e do Facebook. Mas meu recadinho no bloquinho pink foi de
coração. E com esses e outros chacoalhões que virão, com certeza enxergarei
melhor as oportunidades de, no dia a dia, com as pessoas que passam por mim,
observar e oferecer um gesto, mesmo que do tamanho de um post-it, para
tentar ajudá-la. E ajudar a mim, claro.
Comentários
Correria, correria... Pra quê, né?! rs
Bem, enfim... Gostei demais de seu texto, Matheus!
Você fez sua parte e bem feita! Super sensível seu recado. Beijo!
PS.: voltarei às postagens em breve.
Nossa, Lu! E eu senti MUITA saudade de você por aqui. Obrigado pela passada.
Saudade também de um post seu. Volte, sim. Eu vou adorar.
Um beijão.