Conversa de capacete


A sessão começaria às 16h. São 15h20 e há cinco minutos meu celular toca em som da mensagem com o convite para um cineminha no domingo à tarde. A companhia perfeita. O filme, uma overdose de diazepan. Confesso que é comum meus olhos pesarem sempre que paro um pouquinho, qualquer que seja o lugar, mas com a telona em minha frente, somente em filmes como Seven Pounds (Sete Vidas) com Will Smith – coitado.
Mais um, o moto-taxista atendeu dizendo o nome do bairro seguido de “moto-táxi”. É sempre assim, uma falta de criatividade para dar nome aos locais de moto-táxi. Até se chamassem de “Bairro Moto-táxi” seria mais original. Mas não. São cinco toques do telefone e aí vem: “Ipiranga Moto-táxi”, “Centro Moto-táxi”, “Aeroporto” e “Adão do Carmo”. Olha isso, “Adão do Carmo Moto-táxi”, tem como ser pior? Acho que os publicitários fazem campanha para não atenderem empresas de moto-táxi.
Pior que os nomes, é conseguir um no domingo. De cinco toques no telefone passa a ser “sua chamada está sendo encaminha para a caixa de mensagens e estará sujeita à cobrança após o sinal”. Não tem moto-táxi no domingo. E se você conseguir um, prepare R$ 50 na carteira, pois as corridas dobram de preço.
Três números da agenda do celular, dois cartões de visita e uma olhada no poste em frente a casa da minha mãe depois, atende.
“Trabalhamos por conta lá, fazemos o horário que quisermos. Tem cara que não quer saber de domingo, mas cada um faz o seu, né? Eu venho porque a corrida é mais cara, dá pra tirar mais”. Pronto, está explicado. Jeferson, o último dos moto-taxistas em Ribeirão Preto, em um domingo, não abre mão de trabalhar e muito menos em “dia de ano” quando neste 1 de janeiro, colocou na pochete preta, R$ 150. Há um ano em Ribeirão e com cinco minutos de corrida, na Av. Francisco Junqueira, eu já sabia que as empresas de moto-táxi de RP cobram, em média, R$ 25 por semana dos motoqueiros que trabalham nela para “usarem o ponto”. “A gente paga essa taxa e usa uma pá de coisa. Tem geladeira, ventilador, TV e tal”, conta Jeferson.
Nascido em Itanhaém (SP), viveu vinte anos com a família e mudou-se sozinho pra São Paulo. “Lá (Itanhaém), a gente ganha dinheiro uma vez no ano, quando é temporada, aí a cidade funciona. Do contrário, não dá nada”. Na capital, o itanhaense, chegou, e foi embora depois de dez anos trabalhando como moto-boy. “Em São Paulo só pode ser (moto) boy. Você pode carregar qualquer coisa na moto, do tamanho que for, menos gente. Em São Paulo, moto-taxista é multado na certa”, diz.
Sobre a vida em Ribeirão, Jeferson diz que até o clima é melhor para se trabalhar sobre uma moto. “São Paulo chove demais. E aqui é bem mais de boa. Em São Paulo é aquela loucura. Não daria, por exemplo, pra eu ir te levando e falando com você de boa igual a gente está. Lá é gente vindo de todo quanto é lado. Moto costurando os carros. E é assim, entrou no corredor (de carros), tem que ir buzinando, senão você está perdido”.
Mais perigo, mas mais na pochete preta. Jeferson tira por dia em RP cerca de R$ 50 em vez de “mais que o dobro” que tirava na capital. “Mas lá também é muito mais caro, as coisas”, termina o moto-taxista.
Quinze minutos depois, após dar uma volta enorme por conta da reforma no shopping, eu pago e o cara me pergunta se estou indo trabalhar. Respondo que não, vou ao cinema. Ele me devolve, “nossa, nem lembro mais o que é isso”. São 15h35 de domingo à tarde.

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