"E você", cadê?



Na minha vida, aplicativo de relacionamento é igual ao dinheiro extra que vem com as férias: me deixa super animado, a expectativa é maior que a realidade, ele chega, eu experimento, logo acaba e depois fico no prejuízo. Além de a experiência também ser uma vez ao ano.

Quando você decide deletar a sua conta do Tinder, entre as opções de justificativas que o app nos obriga a responder estão coisas como "Não tive nenhum Match" - gente, que triste, não é possível que isso exista - "Encontrei alguém" - gente, que triste, de novo, não é possível que isso exista - "Outros" e mais alguns tópicos bestas.

Fiquei procurando e não encontrei algo como "Me deu Super Like, Super Interessado, Mandou Oi, Eu Respondi Oi Tudo Bem e Ele Devolveu um Tudo, Sem Perguntar E Você?".

Sério. Essa justificativa deveria existir entre as opções de encerramento de conta. Eu fugi daquela convenção de gente sem noção exatamente por esse motivo.

As pessoas dão Like ou Super Like, te enviam a primeira mensagem reforçando o interesse em você e daí para a frente é você sozinho perguntando sobre a pessoa e, se você quiser falar sobre si, saia contando loucamente sem esperar que o outro te pergunte porque, na maioria das vezes, não vai acontecer.

"Boa noite" - o cara.

"Boa noite, Fulano. Tudo bem?" - eu, que inclusive sempre chamo pelo nome no primeiro contato.

"Tudo" - o mala.

"Legal. O que você faz da vida?" - eu ainda com esperança na humanidade e enfiando o meu "Também estou bem, obrigado por perguntar" na bunda porque ele não quis saber.

"Trabalho com vendas" - o mal educado, seco, egoísta que provocou o tal Match com o tal Super Like.

"Bacana" - eu, instantes antes de fechar a conversa e arrastar o nome dele até aparecer o botão Desfazer Match. Um santo recurso. 

Sumia e não dava nem tchau nem motivo. Afinal, pelo jeito eles não queriam saber. Foram três. Mesmo tipão. Deletei o meu perfil. Assim como meu dinheiro das férias na minha conta, o app no meu celular durou cinco dias.

Eu definitivamente não entendo esse jogo de "Eu te quero, mas vem pegar". Cadê a troca? O interesse em realmente conhecer alguém. Nem falo sobre a vontade de conquistar a pessoa porque nem a Disney coloca mais esse ponto em suas animações. Mas cadê a abertura em se apresentar e se interessar em saber?

Há mais de ano, estava eu há uma semana do fim do meu último namoro e chega um direct no meu Instagram: "Oi" - só não botou o "sumido" porque eu e ele ainda não tinha sequer "aparecido". 

Era um conhecido do meu ex que já estava sabendo do fim do namoro e ali estava, tentando contato - um contato que só aconteceria se eu fizesse o papel de perguntar "e você?" sobre cada troca de mensagem.

Mais recentemente, um fofo me mandou convite para adicionar no Facebook. Não aceitei. Eu não adiciono quem eu não conheço. Mas junto do convite, ele mandou uma mensagem privada dizendo que me achou bonito e queria me conhecer. Pensei: "Uia! Quem precisa de aplicativo quando as pessoas buscam conhecer outras também pelo Insta e pelo Face".

Aceitei o convite, trocamos poucas mensagens ali e levamos o papo para o WhatsApp. Pra quê? Ele estava bem. Ele abriu um negócio próprio depois de se cansar da profissão. Ele estava se mudando para uma casa nova. Ele ia morar longe da família. Ele teve um dia cansativo. Ele. Ele. "E você?", cadê? Eu? Sumi. E desfiz a amizade na rede social que o trouxe aparentemente super interessado até mim.

Juro que cheguei a pensar que o motivo fosse eu. Meu papo, sei lá. Mas realmente não sou. Revendo as mensagens, a falta de interesse da pessoa aparece desde as primeiras mensagens. Eu apenas definitivamente não entendo o motivo de os beltranos fazerem o primeiro contato.

Conversando sobre isso com um amigo, ele disse que tem gente que baixa o Tinder e compete para colecionar Super Likes. 

Oi?

A pessoa distribui Super Like para todos que avalia serem bons correspondentes, então espera quem vai dar Super Like ou Like de volta só para printar e ganhar apostas com outras pessoas tão toscas quanto ela. Dá para acreditar? Eu não duvido.

Já escrevi outras vezes que o que se tornou problema para as pessoas namorarem é a alta demanda, o excesso de ofertas. Todo mundo quer saber o que tem de melhor. Cada um escolhe o que te serve enquanto não sossega os olhos para ver o que está perdendo com o que tem ao redor.

Por essas e outras, eu amo o olho no olho. O beijo como um tira a teima. O cheiro que a gente sente no pescoço da pessoa foge a qualquer frase pronta escrita em uma tela. O toque. O pegar na mão ou não. Se ajeitar no outro durante uma sessão no cinema. Isso conta. Isso não se disfarça nem precisa de perguntas como "E você?".

Concluo que o "Oi" que vem para mim aparentemente cheio de interesse, também vai para outros tantos. Nesses casos, eu sou mais um na fila de prioridades dessa pessoa, aguardando se a tal vaga será preenchida com todos os requisitos surreais esperados ou se quem está mais para o fim da fila poderia ser chamado com um educado "E você?", mesmo que fosse realmente para uma fria e desinteressada entrevista para trabalhar no tal Ego de cada um.


~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D|  

Compartilhe pelo WhatsApp
Ao acessar o Caneca pelo celular, compartilhe este texto com seus amigos. É só clicar na descrição abaixo.

~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D|

Comentários

Unknown disse…
Genteee eu amei esse texto. Sério. Achei que só eu era a louca de instalar na euforia e desinstalar em 2 dias...kkkk. Me senti reconfortada!
Querida Desconhecida, reconforto você vê por aqui. Hahahaha Obrigado por ler e comentar.