O Grande Branco

 


A reunião começou e o organizador olhou pra gente e perguntou sobre o que era aquele encontro. Nem ele sabia mais, desde o pedido de discussão do assunto.

Lembro-me de dias depois ele comentar comigo que foi como se, por um determinado período, as coisas do trabalho tivessem sido como um apagão.

Ele compartilhou essa sensação dele no sentido de grandes mudanças terem tirado os seus pensamentos do eixo.

Eis que eu, anos depois desse caso, e tempos desde meu último texto publicado, me lembrei dessa situação que me ajuda a entender um pouco da minha ausência na escrita fora do trabalho.

Troque o “apagão” por – o que vou chamar para o meu caso – O Grande Branco.

Por um lado, deu branco sobre possíveis temas para escrever num momento em que quase toda a inspiração ao redor vem de desgraças. Pra que potencializar o que já está, literalmente, nos roubando o ar, né?

Por outro, ficou delicado escrever. Ficou um tanto difícil se expressar de qualquer maneira. Não vou dizer que estão todos fragilizados, mas posso afirmar que todos estão sendo atingidos por coisas tristes em suas mais diferentes formas.

Meu Branco vem daí.

Dei preferência por deixar em branco pelo receio de a coisa ficar ainda mais... - eu escreveria preta, mas não pode mais porque é pejorativo; viu, como está delicado? – ficar ainda mais complicada.

O meu sentimento é de que – como as máscaras e luvas - tudo está muito descartável. Cada notícia boa surge como um tiro n’água, que desaparece; como um pontinho de cor que some nesse branco todo que tem apagado tudo, que tem diluído toda pincelada que tentamos dar para mudar isso.

Não me lembro do meu pensamento na noite passada, mas sei que tenho dormido mais que nunca. Mal sei falar sobre a minha semana anterior a essa. E assim a gente vem por meses. Porque parece que tudo o que temos tentado está passando em branco.

O dia a dia todo em branco seria ótimo se o sentimento bom, de trazer algo novo logo no próximo minuto; que a gente traçasse isso no nosso caminho e não fosse apagado por uma borracha imensa de incertezas.

Eu acho que o que nos resta é tentar trocar o lápis por caneta, o pincel aguado por um canetão daqueles com tinta que não sai por nada! Persistir.

Se esse Grande Branco insistir em nos confrontar e sumir com nossos traços, ainda podemos tentar imaginar a nossa linha seguindo em frente, chegando e ultrapassando o fim dele.

Se nada disso resolver, vou ter que apelar para uma tesoura que rasgue esse Branco ao meio, que pique em pedacinhos impossíveis de serem colados e que, quem sabe embaixo dele, não tenha mais do branco, mas um tantão de verde para nos dar novas esperanças; talvez um amarelo gritante de felicidade ou um vermelho bem vivo, daquele que nos desperta pelos olhos e chegue até nossos corações!


Comentários