Precisa chover


Eu nunca vivi uma época em que a gente precise tanto de chuva como agora. Precisa chover, precisa chover muito. Falo da chuva que limpa, que refresca, que muda, que dá vida nova. Precisamos muito de uma nova chance e de algo que nos mostre isso, como a chuva faz.

Eu preciso da chuva que leve embora a minha incompreensão, que leve embora a minha falta de tempo e o meu cansaço que acumulam vez e outra embaixo do tapete da minha impaciência.

Precisamos que chova para limpar ódio, o preconceito, a violência e os discursos sem noção que encorajam isso nas pessoas.

Gosto de pensar na chuva que molha e que aos poucos preenche os buracos das nossas incertezas e inseguranças. Penso num temporal que faça barulho, que nos assuste com o trovão sempre que acharmos que sabemos demais ou que temos qualquer direito sobre o outro.

Já a chuva, é direito de todos. Molha muitos de uma só vez. Chove aqui e ali, chove no mundo. Chove fora de casa e precisa chover dentro da gente.

Não importa se chove pela noite ou pela tarde, todo final de chuva traz um novo começo para a gente, um respirar mais aberto, mais gostoso, diferente.

Chover é mudar.

Precisamos de uma boa chuva para limpar toda a sujeira emocional que a morte deixou.

O frescor dessa chuva vai reunir tudo aquilo que foi separado.

Enquanto chover, eu vou sair de casa. Ficar de pé na rua, no estacionamento do meu condomínio, de braços abertos e rosto empinado para o céu. Chuva e lágrimas vão se misturar.

Quero sentir o toque de cada gota e, quando a chuva passar, quero que a sensação gostosa dessas gotas ressurja em lembranças, em novos toques, em diferentes situações do meu dia a dia, como no abraço do meu namorado, no gritinho histérico de alegria da minha afilhada ainda bebê, numa música que ouço sozinho, no comentário sem pretensão que me faz chorar de rir, e em tudo o mais que faz chover e lavar dentro de mim.


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