Dates e dados




Depois de ler a previsão para o meu ano no horóscopo, foi a vez de conhecer o palpite de especialistas sobre as profissões mais valorizadas para os próximos doze meses. A tal lista chegou para mim via Linkedin. Entre os nomeados para o suposto sucesso, a função de analista de dados.

Bem, enquanto nas empresas a coleta de informações nunca esteve tão em alta para entender o perfil do cliente e levá-lo para a compra, eu penso em todas as publicações disponíveis para análise das pessoas que procuram por uma jornada que nos leve de dados para dates.

Certa vez conheci uma pessoa, saímos duas vezes e de repente seu comportamento mudou. Se afastou, mal respondia às mensagens, evitou de voltarmos a nos encontrar. Foi então que ele disse: “Desculpa, mas eu acho que queremos coisas diferentes”.

Oi?

A gente não tinha falado nem sobre namoro ou casamento ou filhos ou cachorros ou qual o sabor favorito de sorvete. Como é possível ter essa certeza de diferenças depois de somente dois programinhas – além de um deles ter sido assistir a um filme no cinema, o que nos deixou mais de duas horas sem conversar.

Depois de insistir um tanto para poder entender o que rolava, ele comentou que havia lido o meu blog e que eu dizia em um dos textos que não me imaginava namorando outra vez.

Oi?! – agora com exclamação e incerteza sobre eu ter escrito isso e arrependimento de escrever e manter um blog.

Quando perguntei em qual post ele leu isso – logo depois que agradeci por ele zerar os meus textos em tão pouco tempo, afinal, educação sempre em primeiro lugar –, descobri que a publicação era de seis meses atrás.

Comentei que aquele era outro momento da minha vida – tanto a fase em que eu havia afirmado isso, como a atual, mas depois desse pensamento sem noção, ele definitivamente passaria longe de ser meu namorado.

O ponto é: se a tal análise de dados está com tudo para o mercado de trabalho, como ela pode ser bem usada para o cenário de relacionamentos?

Era aniversário de uma amiga – que namora – e outra amiga que se juntava à nossa mesa – solteira – trocava olhares com um cara em outra mesa. Enquanto falávamos sobre experiências espirituais, como beber o chá de Santo Daime, essa amiga solteira já estava com tudo encaminhado para o beijo na calçada do boteco em uma jornada para o cliente que a gente não perceberia nem com ajuda de contato com o Divino.

Minutos depois: o beijo. A volta dela para a nossa mesa. A pergunta sobre ele beijar bem. Volta ela para a calçada. Vamos junto para nos despedir. Um “oi” nosso para o cara. Vejo outro beijo. Ao passar com meu carro pelo carro dela, mais beijo.

Era quarta-feira. A promessa foi de se verem no fim de semana. Não rolou. Na troca de mensagens para entendermos o que aconteceu, minha amiga disse que o único contato depois do bar foi praticamente uma pergunta sobre ela ter Instagram. Depois disso, nada. Ou seja, foi aqui que entrou o candidato cheio de interesse em análise de dados. Neste caso, de fotos.

Imagino que este processo seletivo se organizou assim: bebemos no bar, nos olhamos, bebemos mais, nos beijamos, voltamos a beber e bêbado promete sem pensar. Depois de um bom sono e uma olhada na rede social, bateu a ressaca que muitas vezes nem a vontade de conhecer alguém nos cura.

É mais um caso sobre o que postar e como não noiar. Na minha vida, eu guardo essa análise para gráficos e planilhas com informações que nada tenham a ver com o beijo sem orçamento, o toque sem planejamento, a perda da estratégia em um abraço e o olhar que surpreende por não usar filtro.

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