Não sei usar cueca, não sei lidar com seu amor



Um jornalista cansado das babaquices das convenções

Nunca uma mulher teve que me conquistar. Quando interessadas, elas nunca precisaram correr atrás de mim ou fazer algum tipo de malabarismo para chamar a minha atenção, simplesmente porque eu sempre estou aqui. Eu sou fácil, eu quero, eu vou, eu faço, eu preciso.

E talvez nem seja uma questão de ir atrás, mas sim o fato de que eu sou o rapaz sentado sozinho no canto do salão: quem quiser, vai lá e pega.

Muitos homens sempre me falaram que eu não posso "pagar pau" para as mulheres. E "pagar pau", segundo a linguagem dos neandertais, seria não demonstrar interesse em excesso. Só que isso sempre me soou como uma manutenção da ilusão de virilidade, uma espécie de prevenção de dano à masculinidade diante a possibilidade de rejeição. Trocando em miúdos, é o bebê com medo de chorar no colo da babá.

Se eu gosto, eu demonstro - ou ao menos tento, dentro da minha limitada capacidade de sedução mal desenhada nesse emaranhado de genes da mamãe e do papai. "Pagar pau"? Não faz sentido. Eu tenho que me mostrar a quem eu quero. Só que aí entra o tal jogo de sedução, a troca de olhares e sorrisos, o "approach"... "Retribuiu o sorriso? Então é a hora do 'approach'!" Isso me cansa de um tanto...

Mas eu me sinto aliviado de que nenhuma mulher algum dia precisou lutar para me ter, porque eu simplesmente não conseguiria conviver com a pressão de corresponder às expectativas. Afinal, o que é a conquista se não decifrar sinais da superfície que indicam um todo submerso, algo maior? É uma forma de tentar vislumbrar um alguém, por isso é a melhor parte, ou ao menos a mais divertida: é terreno fértil para a mentira. E não é à toa que casais se desfazem depois desse período, já que os sinais superficiais do começo não sustentam as verdades inconvenientes de uma rotina - e aí é terreno fértil para a desgraça.

Expectativa contra a realidade, um embate cruel. Como eu disse, ainda bem que nunca precisei conviver com a pressão de ser conquistado.

Ora, outro dia eu tive que sair de casa com muita pressa. Me vesti como eu pude, com o que eu tinha ao meu alcance. Na rua, percebi que estava usando uma calcinha.

E se eu sequer consigo distinguir cueca de calcinha, não há prova maior de que eu jamais poderia lidar com o seu amor.



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