Amor -> Câncer -> Transformação

Para quem não me conhece, sou a Talissa, colega de trabalho e amiga do Matheus, parceira de bar, de risos e choro. Quando ele me convidou pra dividir meus sentimentos aqui, pensei várias vezes em como começar a escrever. Ordem cronológica dos fatos? Pelo grau de intensidade dos sentimentos? Algo motivacional que pode, quem sabe, um dia virar best-seller? Ué, mas tudo (ou quase tudo) que se torna motivacional passa por um processo de superação e vem o final feliz, não é? Sim, é. Então, de onde eu tiro a mensagem positiva ao contar que minha mãe lutou 3 anos contra um câncer e morreu? Bom, eu começo pelo clichê, nada é por acaso. Quando eu digo 3 anos, eu não aproximei o número, não foi um dia a mais ou a menos. Foram exatamente TRÊS ANOS. Um ciclo! No 23 de março de 2016, peguei em mãos o resultado da biópsia. No momento exato que li o diagnóstico caía o mundo lá fora, uma chuva que fez o dia virar noite, o mesmo eu senti dentro de mim. No dia 23 de março de 2019, pisei no hospital para visitá-la e a noticia já era a esperada, ela tinha partido, descansado. A diferença é que o temporal não se formou. Lá fora um sol radiava luz e dentro de mim o mesmo, é sério. É como se ela tivesse saído daquela luta, daqueles aparelhos e medicações e entrado direto no meu coração muito mais forte, muito mais viva. 





Por essas e outras, tenho evitado o termo “perdi minha mãe”. Não perdi, me despedi dela fisicamente, por enquanto... só que ela continua sendo minha e nosso laço é eterno. Dito isso, o que nem todo mundo sabe é que se despedir de alguém querido por conta de um câncer, não faz só do momento do “até logo” algo difícil, mas todo o processo. Você vê quem ama perdendo a boa aparência, habilidades e tantas outras coisas até o ponto de que nem a dignidade da pessoa se faz presente ali. Uma amiga adjetivou o câncer como “implacável”, nenhum outro termo definiu melhor.

Voltando...foram três anos de luta, três batalhas. Na terceira vez o corpinho dela já não aguentou carregar a grandiosidade e toda a evolução que ela tinha tido e o espírito precisou de algo muito maior e mais pleno do que a matéria poderia oferecer. 

Às vezes me pergunto qual foi o momento que caiu minha ficha que ela estava mesmo indo embora e como seria a minha vida sem ela? A cena que me vem em mente aconteceu dois dias antes, tive uma crise de espirro dentro do quarto de hospital e o sempre presente “saúde” já não estava lá. Antes, se eu espirrasse 15 vezes, o “saúde” ecoava junto com a frase “nossa, como vc espirra”. Naquele momento, silêncio...

Mas...de novo, qual a mensagem positiva disso tudo?

Tem, meu amigo! Acredite! Comecei pela dor para você que me lê nesse momento entender que tudo é possível ser transformado. Do desespero do diagnóstico até a paz na despedida foi um processo longo e doloroso, mas repleto de amor, cumplicidade e compreensão. Foi a descoberta do talento de enfermagem do meu pai, a dedicação e carinho dele que me mostraram o que é uma relação de sucesso. De longe é o maior herói que eu poderia desejar. Da garra, coragem e gentileza da Cirinha, que deixou marcas profundas em várias pessoas que cruzaram o nosso caminho. Hoje me sinto outra e nada disso seria possível se não fosse tudo que vivemos, tudo que eu vi e senti. Talvez se minha mãe partisse só aos 90 de morte natural, não aprenderíamos as lições que a vida traz pra gente todo dia, não lapidaríamos nossa visão de mundo, não teríamos entendido nada...

Pensar na ausência dói, a saudade é foda! As dezenas de mensagens diárias que muitas vezes achei demais, agora fazem falta! Mas quer saber? O amor ameniza as lacunas.

Por mais dor que eu carregue ao pensar no futuro sem ela, aprendi que não é para o futuro que eu tenho que olhar, é para o presente. Ela deixou de olhar para frente há meses e viveu o ''agora'' que ela teve, por que eu faria diferente?

Gosto de pensar e sentir que cada lágrima, cada abraço e até dor, nada foi em vão. Se eu pudesse pedir apenas uma coisa, seria mais 1 mês, não por mim, mas por ela e pelo nosso Benjamin, que tinha acabado de descobrir o que era uma família e ganhado uma vovó apaixonada. Mesmo assim, agradeço porque, apesar da tristeza, ele entrou no momento mais importante das nossas vidas até agora, quando nos vimos realmente como uma família com integrantes que transbordavam bons sentimentos. E para o Ben (e pra nós) ficou o recado mais precioso: “amor, coragem e gentileza nunca são demais”. 

.

E pra você que leu até aqui, não pense que a Cirinha perdeu a guerra, ela não perdeu! A guerreira saiu vitoriosa de uma luta que simplesmente chegou ao fim, mas que durou o suficiente pra nos encher de orgulho. 




~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D|  

Compartilhe pelo WhatsApp
Ao acessar o Caneca pelo celular, compartilhe este texto com seus amigos. É só clicar na descrição abaixo.

~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D| ~D|



Comentários

Unknown disse…
Grande mulher. Nos ensinou tantas coisas. Apesar de pouco tempo de convívio, foi o bastante para que ela nos mostrasse, que mesmo nos piores momentos, não podemos deixar de sorrir.
Uma inspiração, realmente. Obrigado pelo comentário.