Entre as cores das coisas




Que cor você viu quando abriu os olhos pela primeira vez hoje? Enquanto você lê, se fechar seus olhos e olhar para dentro, qual cor vem em sua cabeça? 

Fui assistir – ao adorável – Adoráveis Mulheres e, na mesma proporção que suas pequenas histórias no meio de um conto de família, me chamou a atenção o uso das cores ao longo do filme.

Quatro irmãs com perfis bem diferentes. Uma mãe que educa as meninas enquanto o marido está na guerra. Pobres. E a tia rica que cuida e humilha as sobrinhas na mesma proporção – mas a Meryl Streep pode tudo, pode humilhar o quanto ela quiser, inclusive a mim.

A produção se passa em dois tempos. O das irmãs adolescentes cheias de planos e anseios sobre o futuro e no então futuro apresentado como presente e tudo o que aconteceu com elas desde a juventude. 

Acontece que quando mostrado o passado, o filme nos enche os olhos com tons de amarelo e laranja, enquanto na fase adulta, tudo fica meio azulado, puxado ao cinza.

Triste, né? Eu achei.

Pois se pensarmos que o que foi quente e bom e alegre passou, o que nos resta para enxergarmos a alegria das cores de hoje. Pior: como será a velhice e o futuro deste atual futuro que já chegou?

Será que nesta escala crescente, a coisa vai ficar cada vez mais preta?

Em meio aos trechos amarelinhos do filme, há tanta risada. Tudo é resultado de uma fase em que domina a felicidade. Uma das irmãs chega em casa com o tornozelo torcido depois de tanto dançar em um baile e, imediatamente, as outras se juntam a ela para ajudar e cuidar ao mesmo tempo em que fazem piadas e riem sobre aquilo. É uma festa depois da festa interrompida pelo acidente que em vez de vítimas trouxe ainda mais comemoração.

Já a sensação que fiquei nas cenas que representam a vida adulta foi que, quando não era a tristeza, a doença, a incerteza, a morte, o pouco de felicidade que vinha pela história eram por situações de afirmações, decisões, sacrifícios, como quando uma das irmãs diz ao marido que já tem tudo o que precisa por tê-lo ao lado dela depois de abrir mão da compra de um tecido que ela planejou usar para fazer um vestido. Agridoce.

Azul-cinza: racional. Amarelo-laranja: emocional.

Se as responsabilidades nos escurecem, qual seria cor para o espontâneo? Qual tom você escolheria para o seu filme em um momento de improviso, de leveza, de sorrisos em meio às preocupações?

É preciso se esforçar para a gente conseguir não só manter a cor em nossas vidas, como inventarmos novas tonalidades sobre o acúmulo do que já foi vivido.

O amor cor-de-rosa da infância e adolescência pode, sim, se tornar cinzento ao longo dos anos de um relacionamento, como também pode viver de um vermelho vivo daquele que é retocado todos os dias com a doação ao outro e vice-versa para bombear esse tom e não deixar que ele desbote porque, sinceramente, pior que escurecer é cair no branco que dizem ser o resultado da mistura de todas as cores, ao mesmo tempo em que, o branco, na verdade, não tem cor de nada.

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