Anos
atrás chorei no Dia das Mães porque, naquela semana, uma amiga enterrou a sua
mãe enquanto eu tinha o presente de mais um dia inteiro de comemoração ao lado
da minha. Chorei pela injustiça que a vida nos impõe.
Este
ano, vi uma outra mãe enterrar a sua, também na semana de celebração da data.
Não derramei uma lágrima. Aproveitei mais uma vez a companhia da minha, sem
hora para ir embora, sem me distrair daquele encontro, mesmo enquanto ia ao
banheiro. Agradecia o tempo todo. Agradeço a todo o tempo.
Aos
poucos percebi que o que me comove atualmente não é mais injustiça, a morte, a
perda ou o drama. Esses nos sobram e já tem muita gente chorando por eles.
Chegam com e sem data comercial. Só nos resta esperar e lidar. O que me faz
chorar agora é algo cada vez menos esperado de se ver, com o amor e a
gentileza.
Se
enquanto alguém estiver falando, um outro interromper e imediatamente perceber
e pedir desculpa, dizendo que este alguém pode continuar, meu coração acende.
Se
na porta de uma salgaderia, um cliente sair com uma coxinha na mão para
entregar para o mendigo que pede esmolas do outro lado da rua, meu queixo ganha
mais furinhos que minha bunda contraída e faço beicinho de choro.
Se
eu vir o jovem ajudar um idoso a calçar seus sapatos, o que seria impossível
sozinho porque a idade aumenta e a capacidade do nosso corpo diminui, teríamos
lágrimas molhando todo o caminho até a gola da minha camiseta.
Se
alguém se dispor a ensinar piano para um cego, doando seu tempo e partituras
escritas em braile, meu choro vai ser tão algo e soluçado que faria o bate-boca
aos gritos dos vizinhos aquietar.
O
que isso diz sobre o efeito das coisas sobre a gente, né? Passei a chorar por
presenciar o amor, talvez por sua profundidade, transformação, raridade e
necessidade; enquanto sigo friamente no enfretamento do que poderia ser
considerado uma grande dor. Talvez isso me comova dessa forma porque agora
entendo que a dor passa e a gentileza quando surge, permanece na gente e no
outro.
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